Foto: Aldair Rodrigues
“Se
assumir é uma grande libertação para respeitar o nosso eu interior
e buscar a felicidade”
Natural
de Parintins-Am, 31 anos, Raphaela faz parte da Associação de Gays,
Lésbicas e Travestis de Parintins (Aglpin) na área de finanças. É
educadora no projeto “Viva Melhor Sabendo”, realizado pelo
Healthcare
Foundation
Brasil (AFH); uma iniciativa desenvolvida no Brasil desde 2014 e
agora ganha espaço no município de Parintins. A ação amplia a
testagem do HIV mediante a tecnologia de testes rápidos por fluido
oral, além de conscientizar a população quanto a prevenção.
Raphaela não fugiu do preconceito. Hoje ela luta pela classe LGBTI e
encara a vida de uma forma mais leve e feliz. Sorridente, bem
humorada e com clareza nas palavras, ela conversou com o Mural das
Narrativas e compartilhou sua história.
Mural das
Narrativas:
Como
você se identifica atualmente na sociedade?
Raphaela
Prata:
Eu sou uma travesti, mas me identifico como uma mulher. Aos poucos a
gente vai conquistando o nosso espaço. Não seria uma conquista só
minha, mas de todo o movimento ao qual eu represento.
M.N:
A
partir de que momento você percebeu que o seu comportamento era
diferente dos outros meninos?
R.P:
Na minha infância, entre os sete, oito anos eu brincava muito com
meninas. Eu brincava com as coisas da minha irmã. A minha mãe
comprava uma boneca para ela, eu queria às vezes para mim. Eu não
tive muito contato com meninos. Então eu ficava triste por não me
encaixar nas brincadeiras deles. Devido a isso, eu ouvia muitos
comentários maldosos.
M.N:
Como era a reação da sua família diante desse comportamento?
R.P:
Na verdade eu tenho outra irmã que também é trans.
Meu pai não gostava, na época que eu comecei a me transvestir ele
dizia que eu seguia o exemplo do meu irmão. Ao mesmo tempo em que
ele me aceitava demonstrava que não aceitava. Hoje em dia ele me
apoia em tudo o que eu faço. Eu tenho uma família que é a base de
tudo na minha vida.
M.N:
Qual foi a maior dificuldade durante esse processo?
R.P:
Acredito que, ser aceita na sociedade não foi fácil. É importante
frisar que ninguém escolhe ser uma travesti. Nascemos com isso e se
desenvolve na infância, na adolescência. Eu já me ‘montava’
para shows
de transformismo, e outros tipos de eventos. Mas, passei a me
transvestir constantemente só depois dos dezoito anos.
M.N:
Como
foi o procedimento para oficializar o novo registro de identidade?
R.P:
Eu participo de vários grupos voltados à classe LGBT em Manaus. Nós
do movimento trans de Parintins temos parceria com a ASSOTRAM
(Associação e travestis, transexuais e transgêneros do Estado do
Amazonas) que é de Manaus. Sou muito grata ao Dr. Rodolfo Lobo,
defensor público que abriu muitas portas para a gente nessa questão.
Nos nossos encontros debatíamos sobre esse tema, então foi aí que
surgiu o interesse, já que a lei tramita desde o dia primeiro de
março de 2019. Primeiramente eu troquei o título eleitoral e o
cartão do SUS, ultimamente eu fiz a retificação na certidão de
nascimento em parceria com a defensoria pública. Acredito que na
retificação do RG [registro geral] eu tenha sido uma das primeiras
trans
parintinenses.
M.N:
Você passou por alguma situação constrangedora referente a documentação ainda não oficializada?
R.P:
Uma
vez eu estava num Congresso em Manaus, eu estava toda ‘montada’ e
um rapaz perguntou meu nome e eu disse que me chamava Raphaela Prata.
Ele insistiu em saber o meu nome de batismo, então houve a maior
discussão, mas recebi o apoio dos amigos que estavam comigo no
evento, tentando evitar a situação constrangedora.
M.N:
Como você analisa as políticas públicas ao tratar essa questão?
R.P:
Eu
gostaria que houvesse mais projetos que amparassem os LGBTs. Na
questão da empregabilidade, muitos encontram dificuldades no
primeiro emprego, pela falta de oportunidade, e isso acarreta na
maioria das vezes, o acesso às drogas e prostituições.
M.N:
Como
você enxerga a sociedade, ao tratar esse assunto tão polêmico?
R.P:
Acredito
que, de forma geral existe muito preconceito, mas as pessoas tentam
esconder isso. E também o preconceito existe muitas vezes porque a
maioria demonstra uma certa insegurança, além de que, muitas trans
são vulgares e isso acaba contribuindo.
M.N:
Você está satisfeita com o seu corpo? Se tivesse que mudar algo em
você, o que seria?
R.P:
Estou
satisfeita sim. Acho que não mudaria nada. Eu apenas faço um
tratamento de hormonioterapia em Manaus com uma especialista.
M.N:
A
redesignação sexual é um procedimento operatório muito delicado e
não é somente a troca do orgão sexual, mas depende do processo
psicológico do paciente. Você tem interesse nesse procedimento?
R.P:
Não
e nem pretendo. Não discrimino quem fez, não tenho vontade. Eu
estou muito feliz com o meu corpo.
M.N:
Quais os seus planos para o futuro?
R.P:
No
momento não tenho eles definidos, mas gostaria de ser mais
respeitada na sociedade e nunca deixar de militar pelo movimento que
represento. Quando eu entrei na associação LGBT, não conhecia
muita coisa relacionada ao nossos direitos e agradeço a ela por me
proporcionar esse leque de oportunidades e conhecimentos.
"Eu
gosto e ler, me empoderar nos assuntos LGBT".Raphaela Prata
Foto:
Aldair Rodrigues
"Orgulho
é poder ser quem você é, em um mundo que te diz o contrário".
Raphaela Prata
Foto: Aldair Rodrigues
Maravilhosa meu amor... Admiração por vc Rapha.
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