sexta-feira, 4 de setembro de 2020

BURITI QUADRINHOS DE PARINTINS

 

Integrantes do coletivo Buriti Quadrinhos de Parintins
 Foto: Arquivo Buriti

A arte de narrar histórias sequenciadas por meio de desenhos e textos.  Conceito simples que define as Histórias em Quadrinhos (HQ). A modalidade é antiga, mas sobrevive criativamente, repleta de traços, expressões e críticas sociais.

Segundo a pesquisadora Laura Aidar em matéria para o site todamateria.com.br, as histórias em quadrinhos têm como elementos básicos das narrativas: enredo, personagens, tempo, lugar e desfecho. Nas pesquisas de Laura, a primeira história com essas características foi publicada nos EUA em 1894, na revista Truth, pelo americano Richard Outcault.

De acordo com a matéria, no Brasil, a primeira revista em quadrinhos foi intitulada de “O Tico-Tico”, criada pelo artista Renato de Castro, publicada em 1905 pelo periódico O malho.

Além desses artistas, nomes como o do cartunista Ziraldo (A turma do Pererê), Maurício de Souza (Turma da Mônica), o cartunista argentino Quino (Mafalda) também revolucionaram a arte dos quadrinhos.

Em Parintins-Am essa arte ainda surge timidamente. O coletivo Buriti Quadrinhos de Parintins embarcou na modalidade e têm acrescentado o leque artístico da região, tendo como principal referência, o boi-bumbá. Levi Gama, idealizador do projeto conversou com o Mural das Narrativas e compartilha toda a trajetória do grupo.

 

 

Mural das Narrativas: Quando e como surgiu o coletivo?

Levi Gama/ Buriti Quadrinhos de Parintins: Surgiu dia 12 de março de 2019, idealizado por mim, Levi Gama e minha noiva Rafa Pimentel. A ideia do coletivo iniciou por meio do amigo parintinense, quadrinista do Maurício de Souza, Romahs Mascarenhas. Romahs veio em Parintins, por volta de 2018, ele realizou uma oficina de cartoon, no qual participamos e partiu disso a ideia de querer montar algo parecido. Em 2019, viajamos para Manaus, e conhecendo esse ramo de perto, com toda a organização e valorização de como é trabalhada, aumentou mais ainda a necessidade de criar o coletivo. 


O desenhista Levi Gama e a roteirista Rafa Pimentel do coletivo  
Foto: Arquivo Buriti
 

 

M. N: Como é definida a técnica artística utilizada no projeto?

Levi. B. Q: O quadrinho possui quatro bases principais: o cartoon, semi-cartoon, comix, mangá. Os meus quadrinhos seguem uma linha de semi-cartoon, que é entre o realista e o cartoon, as vezes a anatomia, a estrutura do personagem é um tanto que real, só que a expressão do personagem é caricata. 

 

 

 

Como todo o universo artístico, entender o que se está criando é fundamental. Os precursores das HQs buscaram uma sistematização em torno das técnicas que eles mesmos utilizaram. Sobre isso, Levi acrescenta que, “por volta de 1895 a 1930, os artistas que, produziam tirinhas, faziam sem crítica alguma, não debatiam o que produziam. Nesse tempo da história ainda não tinha o termo técnico para definir essa arte. Tudo mudou quando um cara chamado Will Eisner, o criador do personagem Spirit, além de produzir quadrinhos, passava a criticar o que produzia. Então vem dele o termo técnico das histórias em quadrinhos que, seria a arte sequencial”, diz.

De acordo com as pesquisas de Levi, por volta de 2009/2010, Scott McCloude, se utilizou de outro termo técnico para definir essa arte, chamando-as de Artes pictóricas e outras justapostas em sequencias deliberadas.

 

M. N: Qual o significado do nome Buriti para o coletivo?

Levi. B. Q: O termo buriti, vem do tupi, significa árvore da vida. Antes de encontrarmos esse nome, o nosso objetivo era achar um nome de fácil compreensão, e que as pessoas conseguissem guardá-lo, igual música sertaneja, saca? E não só isso, mas que explorasse um pouco das nossas raízes culturais, das nossas raízes caboclas. O que nos encantou realmente foi o significado do nome e, acabamos associando isso ao próprio processo de criação do grupo. Porque iríamos entrar em algo que, nenhum de nós tinha experiência. Minha noiva e eu não somos artistas com grande atuação no mercado, então era um começo. O nome tinha total ligação com que estávamos passando, como uma semente que nasce e aos poucos vai brotando, até ter frutos, assim como uma árvore. E o buritizeiro é uma das maiores palmeiras do Amazonas e tudo dessa árvore é aproveitável.

 

M. N: Qual o objetivo da equipe Buriti?

Levi. B. Q: Fomento e incentivo à produção das histórias em quadrinhos no município de Parintins. Dar visibilidade àqueles artistas que não tem, por terem outra ramificação cultural, outra identidade artística diferente do que é mais comum aqui na cidade. Já faz um tempo atrás que, acontece certo desenvolvimento dessa área no Amazonas, basicamente em Manaus. Então vimos a necessidade de termos também esse aumento aqui em Parintins. Uma cultura não muito conhecida pelas crianças e adolescentes. Então queremos criar um mercado aqui, não só de histórias em quadrinhos, como Marvel, Dc Comics, produções norte-americanas. Queremos criar um hábito de leitura, de desenvolvimento cultural de valorização das produções locais, dos artistas locais, onde o parintinense se interessa a comprar revistas que enfatizem o próprio cotidiano. E acabe se identificando com as histórias. Não queremos substituir a cultura da pintura na tela, do desenho artístico, do que vemos no boi-bumbá. Queremos agregar valores, conhecimentos e culturas.

 

M. N: Algumas dificuldades no início. Quais?

Levi. B. Q: Tivemos várias dificuldades e ainda enfrentamos. Primeiramente tivemos um receio de sermos interpretados de outra forma, e sermos vítimas de uma atmosfera de preconceito em relação a nossa proposta, ao nosso estilo de trabalho. Então, por Parintins já ter uma linguagem propriamente dita, ficamos receosos com os artistas e o público, sobre a possibilidade de não nos entender. E foi uma preocupação forte que, até nos impedia de querer construir o coletivo. Esperamos um pouco e depois vimos que fomos bastante acolhidos, gostaram realmente do coletivo.  Tivemos algumas desavenças em alguns pontos, mas foi bom. Nosso intuito não é mudar o pensamento e estilo de ninguém, trabalhamos muito com agregação. Outra dificuldade que tivemos, foi a parte financeira. A maioria dos integrantes não tem uma vida financeira estável, são de família humilde. Não tínhamos dinheiro para investir. Então tivemos que pedir ajuda, não obtivemos muita resposta positiva. Os que nos ajudaram não foram políticos, nem da cultura. Foram pessoas comuns, professores, parentes, amigos. Mas isso faz parte, acredito que, todo o coletivo enfrenta. Infelizmente há uma visão preconceituosa também de muitos, por não considerarem essa arte como um trabalho. Mas ainda assim, há o retorno bom de crianças, de adolescente e, isso é um dos motivos de continuarmos.

 

M. N: Algumas exposições realizadas? Se não tem, pretendem expor algum dia?

Levi. B. Q: Participamos de três exposições. A primeira intitulada de “O Amazonas Plural”. Reuniu vários artistas iniciantes, já atuantes no mercado. Fizemos parte como iniciantes. O evento aconteceu na Usina Chaminé, em Manaus. Outra exposição foi no evento do Coletivo Ajuri, na Casa das Artes, em Manaus. A mais recente foi na exposição “Nosso lixo de cada dia”, ocorrido em Parintins. Participamos apresentando uma página de quadrinhos emoldurada. Foi uma experiência ótima. No momento foram as únicas, mas tenho muita vontade de expor fora também do Amazonas, para outros cenários.


M. N: Quais as inspirações artísticas?

Levi. B. Q: Bom. Aqui [Parintins] não se vê bancas de revistas com esse conteúdo. Pouca referência para o artista que quer fazer quadrinho em Parintins. Pesquisando, conheci o trabalho do artista Frank Miller, criador do “Batman, O cavaleiro das Trevas”, e serviu muito de inspiração no início. Outra referência é o Mike Mignola, quadrinista criador do Hellboy. Ele é muito conhecido pelos traços e o expressionismo das histórias em quadrinhos. Hoje em dia, o artista que eu mais tenho como referência é o kim Jung gi, ele não é exatamente um quadrinista, mas já fez quadrinho, trabalha mais com ilustração. Fora esses têm os artistas do Brasil como o Marcelo D’ Salete, ganhou o prêmio Eisner, um dos artistas que nos fazem sentir orgulho de ser brasileiro. Pedro Cobiaco, Shiko, o cearense Netho Diaz, tem obras lindas, é uma inspiração não só como artista, mas como pessoa.




 

 Por  Aldair Rodrigues

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